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Emília Goulart - AAL - Um espaço quadrado


Um espaço quadrado

Geminado, a cozinha tinha um espaço quadrado. A cozinha emprestava uma parede e a copa outro, fechado em dois lados, o canto isolado da casa aguardava mais um cômodo.
A intenção foi abortada pela dona da casa.
–Uma casa com dezesseis cômodos não carece de mais um.  Ninguém vai levantar mais paredes e fechar aquele espaço. Até agora guardei meus palpites, mas agora chega aquele quadrado é meu. Farei dele o que eu quiser.
Quem a ouvisse sem saber do que se tratava a discussão, pensaria em pelo menos um quarto da propriedade.
O homem já andava nervoso com a contra ordem da mulher que exigia a posse daquele pedacinho de terra. O seu quadrado.
–Tudo bem! Fique com a porcaria desse seu quadrado e depois não se queixe das infiltrações que vão aparecer.
–Vitória! – ela saiu gritando feliz e seguida pelas pragas do marido.
– Vai, vai plantar batatas diacho de mulher teimosa.
Ela foi e por onde passava, voltava com uma mudinha de planta diferente. As vezes algumas batatas.
Deveria sofrer de algum transtorno obsessivo, justificava o marido. Talvez ela fosse portadora de um tipo de toque. Mas, isso ninguém sabia e nunca se ouviu falar.
Os meses se passaram, o homem chegava cansado do tralho e era arrastado pela mulher que lhe mostrava a terra revirada:
– Aqui enterrei o príncipe negro, ali adiante a camélia, um pouco à frente enterrou uma enfermeira.
Diante do espanto do marido, ela explicou são rosa brancas, que dão em cachos. 
- Cura tudo ou quase tudo, cobreiro e terçol eu tenho certeza.
O marido começou a se interessar por aquela estranha lavoura que se expandia por todo o redor da casa.
Um dia a mulher viajou, ficaria dias fora e por falta de tempo pediu que ele plantasse em um canteiro ao lado do quarto do casal.
Depois de ano o pedreiro foi fazer uma visita e ver se ele enfim levantaria o cômodo restante da obra contratada. Ele todo orgulhoso vai mostrar o jardim formado no quadrado.
 –Aqui está enterrado o tal do príncipe negro, ali adiante a linda camélia, logo aí do seu lado tem uma enfermeira sabichona, entende de tudo.
O pedreiro já meio assustado tenta mudar de assunto, e a dona Margarida por onde anda?
Antes de responder, ele olha para o chão e grita:
- Saia devagar, você está pisando na minha margarida. 
Ajoelhou-se e com cuidado ajeitou a terra. Ao se levantar, não viu nem sombra do pedreiro





Emília Goulart dos Santos, bisavó, dona de casa. Pertence ao Grupo Experimental desde a sua fundação. Ganhou vários concursos de contos. Escreveu vários livros e publicou outros, inclusive romances. Atualmente é também acadêmica da Academia Araçatubense de Letras. E-mail: emiliagoulartsantos@gmail.com

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