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Alice Silva - GE - Maresias



Maresias

Navegando à deriva, muitas vezes chegamos a lugares interessantes. A viagem não havia sido planejada, foi resolvida no impulso. Estava na praia, virando areia, observando as ondas naquele imenso verde e azul que tanto me encanta. 
De repente lá vem aquela figura: sandálias surradas de couro, jeans todo rasgado, camiseta do Nirvana. A velha bolsa de couro, com suas alças atravessadas no peito, cheia de papéis. Me desejou uma boa tarde, e perguntou se eu tinha um tempo pra ele.
 – Sim! Eu respondi. 
Olhei nos olhos dele, e imediatamente reconheci um poeta. Ele leu para mim seu poema “Barco de Ilusões”. Me perguntou de onde eu era, e se identificou amante da poesia. E me disse: 
–Podes não acreditar, mas vejo de longe quem vai reconhecer o meu trabalho. Em seguida leu para mim “Micróbio Apaixonado”. 
Pedi a ele um rascunho, e ali mesmo escrevi um poema.” Uma ode ao nosso encontro”. 
Ele disse para mim: 
–Ganhei o meu dia! Posso levar comigo? – sim, claro, respondi 
Dei-lhe uma cerveja bem gelada, ele sentou-se ao meu lado,  e ficamos ali , prestando um culto silencioso ao mar: sua força e beleza nos inspirando. 
Disse para ele que nosso encontro estava marcado , ali, naquela praia. Ele sorriu,  e depois de me indicar dois lugares que eu não poderia deixar de conhecer na região, se despediu, seguindo o caminho que só passou a existir quando ele passou, deixando suas marcas na areia quente.
 Fiquei olhando até ele sumir, certa de que nunca mais vou vê-lo. Observei que, dentro do meu campo de visão, ele não abordou mais ninguém...Na minha mão ficaram seus dois poemas, que eu li mais uma vez ali ,e com carinho guardei.  Seu nome? Mauricio Carvalho Marques. Fiquei a pensar quantos talentos por aí vão passar por esse mundo sem serem reconhecidos, marginalizados, sem oportunidade sequer de frequentar um lugar onde possam aprimorar seu dom. 
Lembrei do grupo experimental que tenho a honra de pertencer, e dei ainda mais valor a cada um que a ele se dedica. Aprendemos ali cada dia um bocadinho, sentindo acolhimento e respeito. Voltei-me para o mar a minha frente, e meu corpo pediu um mergulho naquelas águas mornas, límpidas, que ao fim da tarde recebiam um tom dourado majestoso. 
Ali fiquei por algum tempo, com água até o pescoço, sem perceber as mudanças da maré. Sai do meu estado meditativo, quando ouvi um forte assobio e duas mãos acenando com vigor em minha direção. 
Era o salva-vidas, me avisando que eu estava em perigo! Com certa dificuldade saí, e sentei-me na areia ofegante:  já era a hora sagrada do pôr do sol. De olhos fechados, senti no meu ombro a mão quente e protetora do meu companheiro me trazendo para junto dele, na linguagem muda dos amantes.
 Vários casais chegavam nessa hora, adoradores do sol como nós, prontos para o espetáculo gratuito que se daria naquela linda tarde. Vamos agradecer o sol, a lua , as estrelas e o mar? Sem eles, o que seria de nós? Com respeito e reverência deixei a praia naquela tarde, restaurada, feliz.



Alice Mara Barbosa da Silva, 61 anos, araçatubense, formada em Administração de Empresas;  Integra a coordenação do Grupo Experimental da Academia Araçatubense de Letras e participa pela primeira vez de coletânea. E-mail alicemara356@gmail.com

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